sábado, 17 de fevereiro de 2024

Intangível

​Exú corre no rio

E atravessa o tempo


Não tem pegada ou encruzilhada


Exú corre no rio

Tempo avesso e através.



sexta-feira, 8 de julho de 2022

Coivara

​estou fora do tempo.


e este fogo posto

é amor com pressa;


essa fúria 

que nao acata nada ou a ninguém,

arde.


já não percebo,

mas gostava tanto de saber dizer,

quando sou eu que, veloz, queimo.

onde sou eu que, feroz, amo. 





quarta-feira, 4 de maio de 2022

tarde

você ta sempre cansada, preta

e eu 

que quase não sei voar

olho os passarinhos 

cansados, em fios, por cortar o céu da tarde. 

vocês se parecem, preta, parecem demais.


quem diria, né?

um Abril despedaçado te veste de azul

e seja triste como seja o seu anoitecer,

cheira a verão.


sabersaber, não sei

mas já te supus milhões de vezes


às vezes, mas só às vezes,

ganho a coragem de te abraçar 

e o medo vaza

recua-pele

feito a maré

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

Rua da Rosa

​era lindo se eu dissesse que paralisei!

qualquer cena dramática, teatrica, poéturgia do momento.

mas há duas formas de se desistir de viver em vida:

há quem deixe de sentir vontade de estar vivo.

 ponto final, que nem sempre acaba, se arrasta. 

se for o caso, há sempre alguma receita, remedio, reza e cura.


a outra destrói a gente, redenção despercebida; aquela que nos traz ganas. 


Sabe, Canelas, a segunda dói e alivia.

nunca se esta tão vivo, nem tão perto de jogar tudo pro alto.

urgência, o nome, eu acho. vai saber.


mas era lindo se eu dissesse que paralisei, dei de cara com o chinês abrindo as portas de manhã quando desci pra ir ao trabalho, e de súbito qualquer coisa me arremessou pra fora de mim, era lindo, era. 

mas já faz tempo que eu penso nisso, bem verdade;

precisei desistir de viver várias vezes

as várias vidas

nas quais não coube.


ganas, sabe, meu amor?

e qualquer projeção de fundo em preto e branco.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

serenada

  esse vênus em câncer

 me deu uma canseira imensa;


sigo tentando:

 tanto amor suposto,

 pouco se ouve da Bethânia 

que eu deixei tocando. 

O Mago

 me pego olhando as mãos, 


desde que me disse que meus caminhos estavam profundamente traçados em linha reta pro futuro.


não tive condições de pensar em mais nada 

e sabe, Rita, eu tenho sempre um mundo por dentro.



e o que eu faço agora?

nada me salva da vontade de por as mãos ao fogo

e nem é pelo inverno, 

esse caos de ver o mundo queimar

o futuro em cinzas

feito arder suas cartas de tarot

por um calor que não encontro.


não tive condições, Rita.

já não há um fósforo aceso

que não me assuste

que não me aqueça um pouco o coração.

quarta-feira, 21 de julho de 2021

Campo Grande

Sabe, flô, já faz um tempo que quero te falar. 

estou sem máscara.

as notícias correm vandalizando a tela 

e eu quase desespero,

mas tristeza pra quê? 

tenho metido tanto os pés pelas mãos. 

e quem sou eu pra julgar o mundo?


é profundo

esse estado de sítio 

em que meu sotaque vive:

tenho o coração perto da boca, 

e já nem sei quanto tempo

custou

pra perceber.


você me mostrou que qualquer sorriso parece muito

uma mensagem de amor.

até quando é memória 

máquinadotempo


é flô,

hoje é um pouco

do que nunca foi

do que jamais será



(ainda lembro nos dois no Porto da Barra)

beijo, saudade, quem sabe a gente?

quem sabia?


é distante pra trás, eu sei,

e tanto já se caminhou no tempo

vou contar cada passo. 

já faz um tempo que quero te falar

é profundo

meu sotaque, qualquer mensagem

seu sorriso maquinadotempo

é flô, custou pra perceber

saudade.

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Ursa

é uma questão de olhar com calma

a violência homeopática 

do mar.

há ali nas falésias qualquer beleza,

aquela que só as coisas prestes a desmoronar sustentam.



sábado, 27 de março de 2021

cruzamentos

...é Rita, não tem jeito,

há coisas que são mesmo o que são.

eu sento todo dia na linha do comboio

rezo pra Ogum e penso em caminhos,

será que os caminhos pensam em nós?

faz até frio hoje, nem era suposto

cada gota de tinta em meu corpo treme

sinto a poesia do ferro contraído 

contra o chão absoluto, 

luto

pra encaixar pedaços de luz 

pelos olhos astigmatas

nessa descompressão de Março. 

acho que fui feito de metal também, 

aquele que dança com a febre

incapaz de assumir a rigidez dos trilhos,

brilho maleável das estradas lentas

rio

essencialmente cromado no calor das peles.



Intangível

​Exú corre no rio E atravessa o tempo Não tem pegada ou encruzilhada Exú corre no rio Tempo avesso e através.