Exú corre no rio
E atravessa o tempo
Não tem pegada ou encruzilhada
Exú corre no rio
Tempo avesso e através.
Exú corre no rio
E atravessa o tempo
Não tem pegada ou encruzilhada
Exú corre no rio
Tempo avesso e através.
estou fora do tempo.
e este fogo posto
é amor com pressa;
essa fúria
que nao acata nada ou a ninguém,
arde.
já não percebo,
mas gostava tanto de saber dizer,
quando sou eu que, veloz, queimo.
onde sou eu que, feroz, amo.
você ta sempre cansada, preta
e eu
que quase não sei voar
olho os passarinhos
cansados, em fios, por cortar o céu da tarde.
vocês se parecem, preta, parecem demais.
quem diria, né?
um Abril despedaçado te veste de azul
e seja triste como seja o seu anoitecer,
cheira a verão.
sabersaber, não sei
mas já te supus milhões de vezes
às vezes, mas só às vezes,
ganho a coragem de te abraçar
e o medo vaza
recua-pele
feito a maré
era lindo se eu dissesse que paralisei!
qualquer cena dramática, teatrica, poéturgia do momento.
mas há duas formas de se desistir de viver em vida:
há quem deixe de sentir vontade de estar vivo.
ponto final, que nem sempre acaba, se arrasta.
se for o caso, há sempre alguma receita, remedio, reza e cura.
a outra destrói a gente, redenção despercebida; aquela que nos traz ganas.
Sabe, Canelas, a segunda dói e alivia.
nunca se esta tão vivo, nem tão perto de jogar tudo pro alto.
urgência, o nome, eu acho. vai saber.
mas era lindo se eu dissesse que paralisei, dei de cara com o chinês abrindo as portas de manhã quando desci pra ir ao trabalho, e de súbito qualquer coisa me arremessou pra fora de mim, era lindo, era.
mas já faz tempo que eu penso nisso, bem verdade;
precisei desistir de viver várias vezes
as várias vidas
nas quais não coube.
ganas, sabe, meu amor?
e qualquer projeção de fundo em preto e branco.
esse vênus em câncer
me deu uma canseira imensa;
sigo tentando:
tanto amor suposto,
pouco se ouve da Bethânia
que eu deixei tocando.
me pego olhando as mãos,
desde que me disse que meus caminhos estavam profundamente traçados em linha reta pro futuro.
não tive condições de pensar em mais nada
e sabe, Rita, eu tenho sempre um mundo por dentro.
e o que eu faço agora?
nada me salva da vontade de por as mãos ao fogo
e nem é pelo inverno,
esse caos de ver o mundo queimar
o futuro em cinzas
feito arder suas cartas de tarot
por um calor que não encontro.
não tive condições, Rita.
já não há um fósforo aceso
que não me assuste
que não me aqueça um pouco o coração.
Sabe, flô, já faz um tempo que quero te falar.
estou sem máscara.
as notícias correm vandalizando a tela
e eu quase desespero,
mas tristeza pra quê?
tenho metido tanto os pés pelas mãos.
e quem sou eu pra julgar o mundo?
é profundo
esse estado de sítio
em que meu sotaque vive:
tenho o coração perto da boca,
e já nem sei quanto tempo
custou
pra perceber.
você me mostrou que qualquer sorriso parece muito
uma mensagem de amor.
até quando é memória
máquinadotempo
é flô,
hoje é um pouco
do que nunca foi
do que jamais será
(ainda lembro nos dois no Porto da Barra)
beijo, saudade, quem sabe a gente?
quem sabia?
é distante pra trás, eu sei,
e tanto já se caminhou no tempo
vou contar cada passo.
já faz um tempo que quero te falar
é profundo
meu sotaque, qualquer mensagem
seu sorriso maquinadotempo
é flô, custou pra perceber
saudade.
é uma questão de olhar com calma
a violência homeopática
do mar.
há ali nas falésias qualquer beleza,
aquela que só as coisas prestes a desmoronar sustentam.
...é Rita, não tem jeito,
há coisas que são mesmo o que são.
eu sento todo dia na linha do comboio
rezo pra Ogum e penso em caminhos,
será que os caminhos pensam em nós?
faz até frio hoje, nem era suposto
cada gota de tinta em meu corpo treme
sinto a poesia do ferro contraído
contra o chão absoluto,
luto
pra encaixar pedaços de luz
pelos olhos astigmatas
nessa descompressão de Março.
acho que fui feito de metal também,
aquele que dança com a febre
incapaz de assumir a rigidez dos trilhos,
brilho maleável das estradas lentas
rio
essencialmente cromado no calor das peles.
Exú corre no rio E atravessa o tempo Não tem pegada ou encruzilhada Exú corre no rio Tempo avesso e através.